“Olhando para trás, sinto que foi ontem que aprendi a jogar Badminton.” | Entrevista com Vitor Tavares 09/10/2020 - 15:10

Vitor Tavares sempre praticou esportes. Quando criança jogava futebol, na adolescência praticava Mountain Bike Downhill. Apesar de adorar a adrenalina que a modalidade trazia, logo a prática encareceu o bolso. Outros percalços, como encontrar um lugar apropriado para treinar, também começaram a dificultar sua continuidade no esporte. Foi aos 16 anos que o professor Vladimir Rodrigues, do Colégio Estadual de Curitiba (CEP), o convidou para jogar Badminton. Desconfiado, decidiu dar uma chance. Mal sabia que, daquele momento em seguida, não deixaria mais a peteca cair. 

Aos 21 anos, é um dos melhores do mundo na categoria SS6, para atletas com nanismo. Foi três vezes campeão Brasileiro e venceu o Pan Americano e o Sul-Americano. Mira o topo e quer conquistar para o Brasil uma medalha nos jogos Paralímpicos de Tóquio. Nesta entrevista, conta algumas curiosidades dos locais que já visitou e as dificuldades que os atletas enfrentam na quarentena. Lembrando que as lives acontecem às 17h nas terças-feiras, com transmissão pelo Instagram e pelo Facebook. Para conferir a reportagem ao vivo na íntegra, acesse nossa página no Instagram.
 

Na sua primeira competição você se consagrou campeão brasileiro e em quatro anos de treinamento foi classificado para Tóquio. Como isso deixa sua cabeça? 
Fico a mil, pirando, a sensação é incrível. Não tive nem um ciclo completo de quatro anos, com apenas dois eu já cheguei no alto rendimento.  No Parabadminton temos os torneios nacionais, que foi o primeiro que eu fui, em Fortaleza. Fiquei “caraca, que maneiro, vou seguir nisso e treinar mais forte”. Quando viajei para o Peru no torneio internacional e passei na classificação, percebi que estava garantido. Venci na simples contra um atleta japonês, e fiquei muito feliz. Olhando para trás, sinto que foi ontem que aprendi a jogar Badminton. Tive uma trajetória muito legal, mas passou voando.

Qual foi o seu momento de virada de chave, quando percebeu que tinha potencial? 
Final de 2017 e início de 2018, quando vimos que eu era campeão brasileiro e que, a nível internacional, estava batendo de frente com atletas de elite. Falei “não, isso não vai ser apenas um hobbie, vou levar a sério”. Foi quando comecei a engatinhar, porque acho que nunca podemos ir de 8 a 80 em um instante, é preciso ir devagar. Através de patrocínios, e da própria bolsa do Geração Olímpica, criei uma equipe multidisciplinar, que faria o acompanhamento completo. No final de 2019 fechamos a equipe, todos unidos no torneio brasileiro, que foi sensacional. 

Qual é a conquista mais importante da sua carreira?
Tenho duas: a bronze no Mundial e a ouro no parapanamericano. No Mundial foi uma experiência de outro nível, competi ao lado de todos os melhores atletas da minha categoria. E o no Parapan, quando voltei com o ouro para casa, tive a comprovação de que todo o nosso trabalho duro ao longo dos anos tinha surtido efeito. 

Quantos países já visitou? Como foi a experiência?
Olha, já fui para a Irlanda, Turquia, Dubai, Japão… Sem contar as quatro vezes no Peru. Joguei minha primeira competição no Peru, assim como o Pan Modalidade em 2018 e o Sul Americano em 2019. Meus padrinhos moram na Irlanda e nas duas vezes que fui para lá, viajei uma semana antes da competição para curtir a cidade. Nas outras vezes dependeu muito dos horários, às vezes não consegui tempo livre. Tento sempre passear de tarde, pelo menos meia hora. Em Lima eu reservei meia hora de noite para conhecer um pouco. 

Durante as competições, dá tempo para tietar e conversar com os atletas? 
Eu faço dar tempo [risos]. É muito bom trocar essa experiência, porque são atletas que tem anos e anos no esporte e várias medalhas. Quero ouvir o que tem a me dizer e absorver o conhecimento. Afinal, só tenho 21 anos. Estou no começo da minha carreira. 

Qual foi o melhor país, ou cidade, que já visitou?
Irlanda e Canadá. Irlanda porque conheci mais e Canadá porque tinha uma paixão da época da bike. Dubai é estranho para a gente por causa da cultura. Do nada está andando na rua e vê mulheres de burca. A comida também é muito apimentada, você pensa que não tem nada no prato, e quando vai experimentar...

Do que já viu, o que pode esperar das paralimpíadas? 
Tóquio é sensacional. A gente vê pela TV a estrutura sensacional deles, e não só no esporte. Fiz um teste no mesmo ginásio que vamos jogar, então já tive uma primeira ambientação, e posso dizer que o lugar é enorme. Cabe muita gente lá dentro. E a cultura deles é incrível também, são todos muito educados. 

Quem são seus principais adversários?
São três que vão me dar trabalho: Inglaterra, Hong Kong e Índia. Joguei a final contra o indiano no Brasil, mas no Peru ele venceu de mim. Estamos 1 a 1 nessa disputa.

Como funciona a classificação para a sua modalidade?
Não temos torneios que classificam direto. O nosso ranking abriu em março de 2019 e deveria encerrar em março de 2020. Dentro desse ano teríamos 12 torneios, onde os seis melhores resultados seriam classificados. Nesse ranking eu estou em quinta posição, atrás de dois atletas da Inglaterra e dois de Hong Kong. Fiquei com medo de perder a vaga devido ao torneio na Espanha, mas quando analisamos as pontuações, percebemos que mesmo se o sexto colocado vencesse, ele não teria pontos para me desbancar. Por isso optamos ficar em casa, melhor do que se arriscar a contrair o vírus.  

Como está mantendo os treinos durante a pandemia?
Na época que a quarentena foi anunciada eu estava me preparando para o último torneio que me daria pontos classificatórios para as paralimpíadas. Como ele seria realizado na Espanha, nós optamos por não participar da competição, e uma semana depois o evento foi adiado para 2021. Logo no início da pandemia eu fiquei duas semanas sem treinar, apenas fazendo alguns exercícios dentro de casa, que não tem uma estrutura necessária para você evoluir, apenas se manter. Enviava meus treinos gravados para o meu treinador e via minha psicóloga por vídeo chamada. Depois de um tempo comecei a fazer preparação física na casa do Gustavo, que tem uma estrutura melhor. Treinamos só nós dois, tomando todas as precauções necessárias. Agora nós voltamos a treinar, mas com um tempo bem reduzido. Aos poucos a situação vem se normalizando, e logo voltaremos ao que era. 

Teve alguma atividade que não era familiarizado e começou a praticar devido a quarentena? 
Comecei a fazer ioga. Pensa em negócio bom! Com o tempo livre quis experimentar, então fiz algumas aulas online e voltei a meditar, algo que não fazia muito. Às vezes chegava tarde do treino e precisava sair de noite, então não sobrava muito tempo. Recomendo demais para quem quer praticar algo novo, porque ajuda muito no autoconhecimento. Também voltei a analisar vídeos de adversários. Sempre fiz isso, mas agora estiquei meu tempo nessa atividade. É importante ter uma noção do que preciso trabalhar daqui para frente. 

Foto: Alan Spink, @parabadmintonphoto